Elementos da natureza e a produção em arte

Pesquisa e coleta de folhas, sementes, galhos e cascas de árvore despertam nas crianças o senso estético e possibilitam um trabalho com formas, linhas e texturas
Pintura da folha da palmeira e extração de tinta de beterraba

Pintura da folha da palmeira e extração de tinta de beterraba

Todos os anos, realizamos na Escola Tipuana, em São Paulo – SP, uma exposição de artes na festa da primavera, homenageando a Tipuana, árvore que dá nome à instituição e que floresce nessa época do ano. Unindo a beleza da estação com o nosso olhar artístico, realizamos, em 2008, um trabalho que favoreceu o diálogo das crianças com alguns artistas contemporâneos brasileiros. Luiz Sôlha, Arthur Luiz Piza, Beatriz Milhazes, Vick Muniz, Artur Bispo do Rosário, Carlos Vergara e Frans Krajcberg foram os escolhidos. Suas obras contribuíram para despertar e aguçar nos pequenos o olhar sensível e indagador, bem como o senso estético por meio da exploração de cores, formas, linhas e texturas. Além disso, esses fazeres artísticos alimentaram e possibilitaram estabelecer relações com os projetos de sala do semestre.

Um dos trabalhos com o artista Frans Krajcberg, conhecido por sua luta em defesa da natureza e pelo combate às queimadas e desmatamentos excessivos (leia mais sobre ele abaixo), e que utiliza restos de vegetação e tintas extraídas da pigmentação natural, foi realizado com os grupos 2 e 3 (crianças de 3 e 4 anos). Os pequenos estavam lendo uma história sobre Poti, o menino índio, que vivia na mata e na qual o tema sobre a preservação vinha sendo abordado, o que casava com a proposta preservacionista do artista. Iniciamos os trabalhos pedindo a eles que, nos fins de semana, recolhessem, com seus pais, resíduos da natureza encontrados em seus passeios.

Assim começou a nossa riquíssima coleção de folhas, sementes, galhos, cascas de árvores, de formas, texturas e tamanhos variados. Fizemos também um passeio pelo Parque Burle Max (São Paulo – SP), onde as crianças puderam apreciar e coletar mais elementos da natureza. De volta à escola, observamos, manuseamos, identificamos, nomeamos e classificamos todo o material. Organizamos uma roda de conversa e apresentamos o artista, sua história e algumas fotos de suas obras. As crianças gostaram de ver sua casa na árvore e comentaram: “Ele também é índio?”, “Ele pinta a natureza?” e “A gente também vai pintar as folhas?”. Essas perguntas foram as disparadoras principais de nossas atividades.

Folha de palmeira pintada com nanquim e tingimento de cascas de árvore "Mameleuca".  Colagem de folhas, cascas e flores da árvore Tipuana.

Folha de palmeira pintada com nanquim e tingimento de cascas de árvore “Mameleuca”. Colagem de folhas, cascas e flores da árvore Tipuana.

Aproveitando as pesquisas que vínhamos fazendo sobre a pintura corporal dos índios, iniciamos a extração de pigmentos naturais como o da beterraba, do urucum, do espinafre e da páprica. Além de captar cores em tons suaves e fortes, que puderam posteriormente ser utilizadas em atividades de artes plásticas, fizemos experiências em culinária, que possibilitaram à turma experimentar alguns alimentos. Nesse momento, o grupo formulou hipóteses: “O azul vem da chuva?” e “O marrom, da terra?”. A partir daí, começamos a intervenção plástica propriamente dita. Realizamos muitas atividades de pintura e tingimento de folhas, galhos, areia e troncos selecionados de nossa coleção. Fizemos ensaios, que serviram como experimentos para observações das crianças e formulação de hipóteses, garantindo o envolvimento e a apropriação efetiva delas com relação ao processo.

Foram quase dois meses de dedicação até o dia da nossa exposição. Estávamos todos ansiosos e, ao mesmo tempo, satisfeitos e orgulhosos com o resultado alcançado por nossos pequenos. Suas obras de arte coletivas e individuais foram especialmente organizadas e expostas ao ar livre, utilizando o espaço da areia, e ela própria como instalação, compondo um cenário em meio às árvores, coerente com o trabalho de Krajcberg, o artista estudado. Temos certeza de que esse foi um trabalho bastante significativo, pois propiciou vivências marcantes e gerou muitas aprendizagens.

(Marina L. Guimarães, Maria C. Proença e Luciana M. P. Gamero, diretora, coordenadora e professora, respectivamente, da Escola Tipuana, em São Paulo – SP)

Colagem com areia e serragem tingidas - Produções feitas pelas crianças da escola Tipuana, de São Paulo – SP – fotos: arquivo da escola Tipuana

Colagem com areia e serragem tingidas – Produções feitas pelas crianças da escola Tipuana, de São Paulo – SP – fotos: arquivo da escola Tipuana

Franz Krajcberg

O artista nasceu em Kozienice, na Polônia, em 1921, mas se naturalizou brasileiro. É pintor, escultor, gravador e fotógrafo. Sua obra reflete a paisagem brasileira, em particular, a floresta amazônica e a constante preocupação com a preservação do meio ambiente. Krajcberg utiliza sempre elementos da flora, em especial, troncos devastados pelas queimadas, que destroem a vida na floresta. Atualmente, tem se dedicado à fotografia. Ele sempre diz: “Quero criar com a natureza, assim como outros estão querendo criar com a mecânica. Não procuro a paisagem, mas o material. Não copio a natureza”.

“Minha obra é um manifesto. O fogo é a morte, o abismo. O fogo me acompanha desde sempre”. Franz Krajcberg (Foto retirada do livro Brazilian Sculpture – An Identify in Profile - escultura brasileira – perfil de uma identidade)

“Minha obra é um manifesto. O fogo é a morte, o abismo. O fogo me acompanha desde sempre”. Franz Krajcberg (Foto retirada do livro Brazilian Sculpture – An Identify in Profile – escultura brasileira – perfil de uma identidade)

Ficha técnica

Escola Tipuana
Endereço: Av. Diógenes Ribeiro de Lima, 916 – Alto de Pinheiros – São Paulo – SP – CEP: 05458-001 – Tel.: (11) 3023-0608
Diretora: Marina Lopes Guimarães
Coordenadora pedagógica: Maria Cristina Proença
Professora: Luciana Macedo Perez Gamero
E-mail: tipuana@escolatipuana.com.br
Site: www.escolatipuana.com.br

Uma das instalações  da exposição: cascas de eucalipto coloridas em base de argila

Uma das instalações da exposição: cascas de eucalipto coloridas em base de argila

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