Fenômenos da natureza

É fundamental ouvir as crianças para saber o que elas pensam e, assim, poder ampliar seus conhecimentos e favorecer a investigação e a reflexão
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Ilustração de Elisabeth Teixeira, retirada do livro Os Três Cães Negros, de Elisabeth Teixeira, Larousse do Brasil, 2009

Desfrutar a infância tranquila em uma cidade pequena do interior mineiro pode ser considerado como fator de influência na escolha do tema que pesquisei. A curiosidade, a observação, o gosto por elementos da natureza e pelas crianças fizeram me optar pelo magistério como primeira profissão, iniciando meu trabalho em uma escola rural, com turma multisseriada. A pesquisa Crianças de seis anos no ensino fundamental: elementos de ciências em escolas rurais do município de Três Pontas, em Minas Gerais1, foi realizada com alunos que ainda não sabiam ler nem escrever. O estudo discute os conhecimentos que esses estudantes têm sobre os fenômenos da natureza a partir de rodas de conversa, apoiado na teoria da Análise do Discurso, iniciada na França, com Michel Pêcheux2, e em textos publicados por Eni Puccinelli Orlandi3, no Brasil.

É possível destacar como variáveis as condições sociais, culturais, econômicas e políticas dos sujeitos da pesquisa: crianças da região rural mineira, do município já citado, seus modos de viver, de brincar e de se relacionar em casa e na escola. Para ir à instituição, para o trabalho de campo, eu utilizava o mesmo transporte que as crianças e os professores. Durante uma viagem de mais de uma hora, o ônibus circulava toda a serra que deu origem ao nome do município. Passava pelo Córrego das Pedras, que contribui para irrigar áreas de plantações de tomate, mudas de café e abastecer currais, e dirigia-se para Taboão, Rancho Grande, Triunfo e Porteira de Tábua; depois, retornava às Bananeiras. Para entender melhor, é interessante ressaltar que, após a nucleação das escolas rurais, a maioria dos alunos depende do transporte escolar e de uma dura rotina para chegar à escola. Ao planejar os encontros e as aulas, essas especificidades foram consideradas. Vale destacar algumas delas: os lugares por onde as crianças transitam, a escola, as salas de aula, a área externa, os pátios arborizados, a casa, os cafezais, as estradas e a cidade.

A riqueza do ensino de Ciências pode estar em coisas simples. Aproveitar e usar os ambientes externos como local de experimentação científica, dar atenção à utilização dos recursos da comunidade, trabalhar com o entorno, despertar o olhar atento para a observação dos cenários naturais, promover ações em que as crianças possam vivenciar a riqueza e o entusiasmo de conhecer o mundo natural, podem se tornar boas situações de aprendizagens científicas. (comentário de Luciana Hubner4)

Pesquisa de campo
De onde vem o discurso dos alunos que vivem no meio rural, que se revela no momento que falam sobre sua vida, seu trabalho e o vento? Ou ainda, como compreender o que não disseram? Eles não falam apenas sobre o assunto proposto. Conversam sobre os mais diversos temas. A conversa pode ser entendida como prática do cotidiano escolar, que tem a capacidade para articular redes de conhecimento.

É fácil observar o interesse das crianças pelos quês e porquês de fatos e fenômenos da natureza por elas observados. Elas são curiosas, questionam, investigam e buscam respostas para suas perguntas. O contexto em que vivem é um campo rico para impulsionar aprendizagens. (comentário de Luciana Hubner)

Na primeira fase, a intenção foi a de conhecer melhor o cotidiano e os principais interesses das crianças. Elas falaram sobre a vida no campo, do que gostavam de fazer, onde brincavam, contribuindo para a elaboração de referenciais que me auxiliaram na composição de elementos que poderiam apontar possíveis caminhos de como estabelecer modos de trabalhar, no sentido do avanço dos conhecimentos relacionados à ciência.

Conversas sobre ações, características e organizações da rotina podem se transformar em espaços vivos de informações sobre diferentes conteúdos, que compõem o universo de conhecimentos construídos pelas ciências naturais e sociais. (comentário de Luciana Hubner)

Para a segunda fase, planejei realizar um trabalho no qual o assunto a ser discutido com a turma deveria estar relacionado aos interesses manifestados. Essa atividade serviu para confirmar que o meio rural pode ser considerado como um espaço privilegiado para a observação de alguns fenômenos naturais e onde questões sociais também estão presentes.

Realizei as atividades em duas escolas. Nos dois encontros, de aproximadamente 4 horas cada um, o papel mediador do professor e o meu, como professora pesquisadora, foi decisivo nos momentos de interação com os discursos infantis, nas atividades realizadas.

Pensamentos sobre o vento
Iniciei o estudo sobre o vento utilizando o globo terrestre e o texto da enciclopédia Barsa. O globo permitiu mostrar às crianças a representação de correntes de ar. Com a ajuda da professora titular da sala, ele foi passado de mão em mão. Ela acompanhou a trajetória do objeto pelas mesas, conversando animadamente com os alunos. As crianças, individualmente, o pegavam, o rodavam e o observavam. Algumas preferiram trocar informações com os colegas ao lado, comentando e apontando para determinados lugares. Leia, a seguir, a transcrição de um momento de conversa:

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Vista da cidade de Três Pontas (www.trespontas.mg.gov/img_lis.aspx)

Professora pesquisadora: Sabe o que eu trouxe para vocês, para ajudar a gente a pensar sobre o que estamos falando? Trouxe uma enciclopédia e um globo terrestre. Vocês sabem o que são esses objetos?

Felipe: Ram ram (balançando a cabeça em gesto afirmativo).
Ana Maria: É na onde a gente fica.
Professora pesquisadora: É o nosso planeta (referindo-se ao globo)? Qual o nome do nosso planeta?
Grupo de crianças: Brasil.
Professora pesquisadora: Como chama este planeta?
Chama-se Terra. O planeta em que nós vivemos chama-se…
Grupo de crianças: Terra.

Com essas informações, cobrei e usei a repetição empírica.

Professora pesquisadora: O país em que nós vivemos é o …
Grupo de crianças: Brasil.

No entanto, a retomada da fala anterior das crianças leva-as a uma diferenciação, a um deslocamento em relação ao que haviam dito antes.

Professora pesquisadora: É este (mostrando o Brasil no globo)?. E estes outros lugares que vocês estão vendo aqui? Amarelo, rosa, roxo, alaranjado… são outros países, tá? Com outras cidades. E esta parte todinha azul, o que será isso?
Felipe: Mar
Ana Lúcia: Céu.
Professora pesquisadora: Essa parte azul é…
Crianças: Água.
Professora pesquisadora: Água, o céu é aqui, de fora (com as mãos em forma de concha, um pouco afastada do globo, contornamos toda sua superfície). Isso aqui tudo é água, são os mares, os oceanos, os rios.

Para Ana Lúcia, a parte azul representava o céu, espaço sempre pintado dessa cor nos desenhos feitos na escola. Deixei as crianças falarem sobre suas impressões, depois mostrei no modelo a localização das águas e do céu (espaço celeste). Os equívocos só aparecem quando ouvimos o interlocutor. É importante que sempre haja um momento para o professor dar as explicações, pois, colocadas logo em seguida aos equívocos, podem contribuir para a construção de novos significados. Nesse caso, a professora se apoiou na posição da maioria das crianças.

Professora pesquisadora: Vocês acham que no mundo, no planeta Terra, tem mais água ou mais terra?
Crianças: Mais água.

Com problemas escolares bem planejados, os alunos podem caminhar de uma postura cotidiana e espontânea para uma postura mais sistemática e científica na resolução de problemas (compreender e responder melhor às perguntas que possam ser propostas a respeito do funcionamento cotidiano da natureza e da tecnologia.) (comentário de Luciana Hubner)

Transformando conhecimentos espontâneos
É possível que as crianças tivessem recebido essa informação antes, mas é provável que o globo, como recurso disponível em sala de aula, tenha contribuído significativamente para que elas respondessem às questões. O texto que preparei para ler e comentar com a turma continha informações a respeito dos efeitos do vento sobre o mar. Tratava-se de uma informação relevante, considerando que a maioria dos mineirinhos talvez não conheçam o mar. No entanto, a ação do vento sobre as ondas foi uma das primeiras informações que um dos alunos incluiu na conversa. Imagens veiculadas pela televisão e gravuras nos livros didáticos podem ter sido responsáveis pelo dado trazido por Felipe. As crianças contribuíram ricamente com o que trouxeram de suas próprias experiências com o vento:

Hoje em dia, a informação científica está muito mais disponível e divulgada pela mídia. As crianças têm acesso a essa informação diariamente. Faz-se importante que a escola considere, dê espaço e valorize os conhecimentos que elas já possuem, construídos de suas vivências extraescolares e convivência com outros adultos. Propiciar múltiplas vias de comunicação estimula uma aprendizagem de alto nível. (comentário de Luciana Hubner)

Maicom: O vento sopra as foia e cai no chão.
Professora pesquisadora: É. Varre o chão da gente, quando o vento é forte. O que mais o vento faz?
Wendel: Dirruba árvore.
Felipe: Derruba árvore com vento mais forte.
Rafael: Dirruba casa.
Professora pesquisadora: Derruba casa? Vocês já viram? Eu vi na televisão que o vento era tão forte, que derrubou uma casa inteira. Quando o vento é fraco ele tem um nome, quando o vento é forte ele tem outro nome. (…) O que mais o vento faz?
Rafael: Esses dias, tava dano um vento forte lá em casa junto com a chuva. Aí entrou água. Aí, quando eu fui pra fora assim, o vento quase me engoliu assim, pra parede assim.
Professora pesquisadora: É, o vento empurra a gente…
Wendel: O vento tira as teia da casa.
Professora pesquisadora: O vento faz isso, gente?
Crianças: Faz.
Professora pesquisadora: O vento arranca as telhas da nossa casa, se ele vier forte, aí ele consegue arrancar.
Maicom: A minha casa, a teia da minha casa não consegue. Lá em casa deu um ventão forte mais não ranca.
Professora pesquisadora: Não? Que bom, né, que as telhas da sua casa estão bem presas. Gente, será que o vento só faz coisa ruim?
Crianças: É.
Professora pesquisadora: O vento não faz coisa boa não?
Crianças: Não.

O trabalho deve criar condições para que os conhecimentos que os alunos já têm quando chegam à escola, aqueles que trazem de suas vivências extraescolares, se transformem em objetos de estudo a ser investigados e desenvolvidos dentro da sala de aula. Entender as Ciências Naturais é aceitar as verdades como provisórias e em permanentes mudanças. É não acreditar em explicações dadas como definitivas e absolutas. (comentário de Luciana Hubner)

Continuei com a enciclopédia nas mãos. Agora, lendo informações na Escala de Beaufort5, que caracteriza os tipos de vento. Li os nomes que o vento recebe:
Professora pesquisadora: Quando esse vento é bem fraquinho, ele chama calmaria.
Felipe: E o outro chama nervoso.

Felipe utiliza, para nomear outro vento, a expressão que acabou de ouvir no Rap Você conhece o vento?: “O vento faz a festa nas folhas da floresta, mas, se ele fica nervoso, vira um furacão (e não respeita nada na contramão)”. As explicações prosseguem:

Professora pesquisadora: Quando ele é um pouquinho mais forte, chama-se bafagem. Quando aumenta mais um pouquinho, ele se chama aragem. Se o vento aumentar mais um pouquinho, vai se chamar vento fraco e, depois, vento moderado, e assim vai aumentando. Gente, a velocidade do vento vai aumentando, ele vai se chamar vento fresco, muito fresco, forte, muito forte. Depois, temporal, temporal desfeito. E quando é bem forte mesmo, sabe como ele se chama? Tormenta.
Rafael: Sabia que a água abafa a gente? Abafa a gente, a gente fica andano se tiver choveno assim muito, muito, a gente não consegue. Na chuva memo, a gente não consegue.
Professora pesquisadora: No mar ou na chuva?
Rafael: Na chuva memo, a gente não consegue, a gente afoga.

Novamente, Rafael é quem faz a pergunta e se sente à vontade para isso. Possivelmente, ele percebeu que os questionamentos, as dúvidas, perguntas e respostas estavam sendo bem-aceitos.

Professora pesquisadora: A gente pode ser arrastada pela chuva sim. Sabe como se chama um vento muito forte, muito forte? Furacão, 117 km por hora, bem forte mesmo.
Felipe: Katrina.

O ensino de Ciências não se restringe à construção de conceitos científicos. Sua função vai muito além, devendo proporcionar a construção de habilidades, de comportamentos e de valores indispensáveis à formação de um cidadão inserido em um mundo globalizado, em que o ser individual deve ter consciência de que é parte do todo e, portanto, por ele responsável. Aprender um conceito científico significa tomar as palavras para si, usando-as em diferentes contextos como ferramentas para o agir e o pensar. (comentário de Luciana Hubner)

Felipe ativa sua memória discursiva e fala da notícia do Furacão Katrina. Esse fenômeno ocorreu em uma região dos Estados Unidos da América, em maio de 2005. Provavelmente, Felipe viu as cenas pela televisão e, dada a oportunidade, compartilha a informação com a professora e os colegas. Não dei mais atenção à sua contribuição porque somente quando transcrevi esses dados de pesquisa é que captei a voz de Felipe no momento em que a câmera focalizava outras crianças.

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No mato o vento nas árvores, na praia o vento nas águas, o som, e a cantiga do vento (João Magalhães, 8 anos)

Como mediações da linguagem, cantamos, conversamos, lemos e discutimos. Assim, concluímos a primeira parte da aula. Não deixei de tratar dos assuntos por considerá-los difíceis ou complexos. À medida que eram abordados, observava o interesse e envolvimento de todos. Isso auxiliou-me na tarefa de detectar se o assunto fazia sentido ou não. Algumas expressões e palavras foram adaptadas para a melhor compreensão por parte das crianças, mas não deixei de utilizar também outras possivelmente desconhecidas para eles. O propósito, nessa fase, foi também o de mediar, para os pequenos interlocutores, a noção de que a enciclopédia, bem como outros materiais, contém informações que podem ser consultadas a qualquer momento.

Novos conceitos formados
A segunda escola está localizada em uma região descampada, cujo posicionamento geográfico contribui para que seja um local bastante ventoso. Tais referências me levaram a escolher assuntos relacionados ao vento, como tema principal a ser tratado no planejamento da aula. O meio rural pode ser considerado um espaço privilegiado para a observação dos fenômenos celestes.

As crianças constroem conhecimento internamente, interagindo com o mundo para aprender como ele funciona e para ressignificá-lo. O adulto age como ponte entre os conhecimentos socialmente aceitos e tidos como verdadeiros e o que as crianças estão percebendo em seu ambiente. (comentário de Luciana Hubner)

Observei que as situações embaraçosas vividas no meio rural, causadas pelo vento, foram as primeiras a ser destacadas pelas crianças. Elas chegaram até a dizer que o vento só fazia coisas ruins. Mesmo com essas afirmações, provoquei uma reflexão para que elas pudessem repensar seus conceitos sobre ações causadas pelo vento e até encontrar algo de bom que ele poderia oferecer:

Professora pesquisadora: Ou será que tem alguma coisa boa que o vento faz? Vocês sabem falar alguma coisa boa que o vento faz pra nós?
Felipe: Ventinho.
Wendel: Calor
Professora pesquisadora: Que tem o vento com o calor?
Rafael: Quando a gente tá com calor, aí o ventinho é gostoso.

É Rafael quem responde ao questionamento que fiz a Wendel e, para isso, ele usa as contribuições dos dois colegas: relação benéfica do ventinho com o calor. Maicon havia dado uma significativa contribuição durante a aula ao falar da ação do vento sobre as telhas de sua casa, sobre a capacidade do vento em movimentar as folhas das árvores. Ao ouvir seus colegas recapitulando o assunto, colocou-se como autor do discurso anteriormente produzido, afirmando que já havia falado tudo aquilo antes:

Professora pesquisadora: O que mais, Rafael?
Felipe: Ele sopra o cata-vento.
Rafael: Ele lava as coisas, não lava não, ele não lava. Ele barre o terrero.
Maicon: Eu já falei aquela hora.

Apresentei também a música Vento Rei6, gravada no Ceará, não apenas por ter o vento como tema, mas também pelo som das flautas de pífano, violão, percussão e a voz da criança interpretando a música, que trariam para a sala de aula as vozes do vento.

Elos com a literatura podem contribuir para a ampliação do conhecimento científico, ampliar vocabulário e favorecer a interpretação de fatos e ações. (comentário de Luciana Hubner)

Professora pesquisadora: O que é jangada? Vocês sabem?
Crianças: Não.
Professora pesquisadora: É um tipo de barco. As pessoas que moram no Ceará pescam muito e elas, pra ir pro mar, vão de quê?
Crianças: Vão de barco
Professora pesquisadora: E o barco mais comum que existe no Ceará chama-se jangada.

Aí, nós vamos ouvir os meninos do Ceará cantando uma música do vento. Na sequência, apresentei uma série de episódios nos quais diversos assuntos foram se articulando. Jangada foi mais uma versão para barco cuja denominação a turma teve oportunidade de conhecer. Novas informações são importantes nos episódios de ensino. Dessa maneira, ampliam-se as possíveis relações entre diversos tipos de conhecimento. Após várias conversas sobre o vento e os inúmeros nomes atribuídos a ele, além das coisas boas e ruins que ele faz, passamos ao trabalho prático, previsto para esse episódio do ensino. Confeccionaria com as crianças uma jangada. Essa atividade, para além do produto final, foi pensada como mais um recurso capaz de constituir uma mediação para o avanço de temas relacionados às Ciências. Veja, a seguir, a experiência e o pensamento das crianças sobre o que o vento faz no mar e em outras situações:

Independente do nível de sofisticação, a situação pode se tornar um favorecedor da construção do conhecimento e cultura científica à medida que possibilita observar, formular hipóteses, propor explicações, experimentar, observar e partilhar resultados com outros pares. (comentário de Luciana Hubner)

Professora pesquisadora: Antes de a gente ouvir o que os meninos de São Paulo falam sobre o que vento faz, o que vocês acham que o vento faz?
Rafael: Sopra frio.
Wendel: Chuva.
Rafael: O vento misturado com chuva cai gaio.
Professora pesquisadora: O vento misturado com chuva? O que mais?
Felipe: Sopra as ondas.
Professora pesquisadora: O vento sopra as ondas do mar? O vento sopra as ondas do mar pra lá, pra cá…

Quando as crianças enfrentam um determinado fenômeno que não podem explicar, ou para cuja explicação não possuem conhecimentos, se abre a possibilidade de colocar estratégias diferentes para poder avançar conceitualmente. (comentário de Luciana Hubner)

Ao finalizarem a construção da jangada:

Professora pesquisadora: Vou colar a vela. Pra que será que serve este pedaço de pano que as pessoas põem na jangada? Rafael, Felipe, Iara, quero todo mundo me ajudando a responder isso, olha.
Felipe: É porque, é pro vento soprar.
Professora pesquisadora: E fazer o quê?
Felipe: Pra levar.
Professora pesquisadora: Então este pano, que se chama vela nos barcos, segura o vento e faz o quê? Faz o barco…
Felipe: Ir.
Professora pesquisadora: Ana Maria e Jeniffer vão pôr bem devagarinho dentro da bacia a jangadinha.
Felipe. Sopra, gente!

Desempenhar o papel de catalisador, consultor e facilitador faz do professor um facilitador do ensino. (comentário de Luciana Hubner)

Apenas um grupo soprou as velas da jangada, que deslizou sobre a água. Foi um momento de vibração para toda a turma. Assim, a linguagem interessou muito, já que o desejo, nesse trabalho, foi o de ouvir as crianças de 6 anos, que vivem no meio rural. De onde vem o discurso delas revelado no momento em que falam sobre sua vida, seu trabalho, sobre o vento e o arco-íris? Elas falam de lugares e de posições diferentes, falam como alunos, filhos, crianças. Falam sobre o que ouvem de outras pessoas, o que aprendem em casa, na escola, pela televisão. Ou ainda, como é possível compreender o que não disseram? O silêncio das que nada falaram, as palavras que não foram ouvidas ou que, aparentemente, não foram consideradas, constituíram-se também em discurso, que é “movimento dos sentidos, errância dos sujeitos, lugares provisórios de conjunção e dispersão, de unidade e de diversidade, de indistinção, de incerteza, de trajetos, de ancoragem e de vestígios.”7 A dinâmica dos discursos ocorridos em sala de aula, ao longo desse trabalho, permitiu relacionar a linguagem ao cotidiano.

(Glória Lúcia Magalhães, pedagoga, mestra pela Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (FE/Unicamp), membro do grupo de pesquisa da FE/Unicamp e da Secretaria de Educação da cidade de Três Pontas-MG)

1Dissertação defendida por Glória Lúcia Magalhães, na Faculdade de Educação da Unicamp, em 2008.
2Michel Pêcheux (1938-1983), filósofo francês que fundou a linha de pesquisa conhecida como Análise do Discurso Pechetiana.
3Professora titular de Análise do Discurso do Departamento de Linguística do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) e coordenadora do Laboratório de Estudos Urbanos (Labeurb), ambos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
4Especialista em Ciências, formadora do Instituto Avisa Lá e gerente de Formação de Projetos Educacionais da Sangari Brasil, ambos em São Paulo (SP).
5Sir Francis Beaufort (1774-1857), almirante britânico, criou uma escala, de 0 a 12, ao observar o que acontecia no movimento do mar (superfície e onda) em consequência da velocidade dos ventos. Posteriormente, essa tabela foi adaptada para a terra.
6Composição de Zé Maia e Calé de Alencar, interpretada pela Banda Girassol, de Fortaleza – Ceará.
7Análise de discurso: princípios e procedimentos, de Eni Puccinelli Orlandi.

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Serra das Três Pontas

Ficha técnica

Glória Lúcia Magalhães
Email: gl.magalhaes@yahoo.com
Prefeitura Municipal de Três Pontas – MG
Secretaria Municipal de Educação de Três Pontas
Endereço: Rua Bento de Brito, 451 – Centro – CEP: 37190-000 – Tel: (35) 3265-4011
Email: educacao@trespontas.mg.gov.br
Site: www.trespontas.mg.gov.br

Luciana Hubner
Email: luciana.domingos@sangari.com

Para saber mais

Livros

  • Análise de discurso: princípios e procedimentos, de Eni Puccinelli Orlandi. Pontes Editores: Campinas – SP. Tel.: (11) 3252-6011. Site: www.ponteseditores.com.br
  • Crianças de seis anos no ensino fundamental: elementos de ciências em escolas rurais do município de Três Pontas/MG. Dissertação defendida por Glória Lúcia Magalhães, na Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, em 2008. Site: http://www.fe.unicamp.br/ensino/producao_cientifica/index.html
  • Papel da memória, de Michel Pêcheux. In: ACHARD, P. et al. Papel da Memória. Tradução e introdução de José Horta Nunes Pontes. Pontes Editores: Campinas – SP. Tel.: (11) 3252-6011. Site: www.ponteseditores.com.br
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