Lidar com as diferenças na sala de aula sempre foi um desafio para os professores. O desejo de classes homogêneas tem sido constante nas escolas e agora a ordem é incluir. É preciso apoiar os professores nessa nova atitude
Vivemos um momento na Educação em que a ordem é incluir. A escola, até então pautada em um princípio homogeneizante, no que diz respeito ao projeto educativo e à população atendida, precisa agora trabalhar com a diversidade. A inclusão escolar não acontece isoladamente. A regulamentação de leis que prevêem a entrada de crianças com necessidades especiais na escola regular acompanha um movimento maior, mais amplo, de cunho político e social, pautado nos princípios democráticos, que preconizam a igualdade de acesso às oportunidades e o combate à exclusão social. Quais mudanças esse movimento traz para a formação de professores, para os planejamentos escolares e para as configurações dos espaços institucionais?
Incluir significa trabalhar com diferenças
A escola regular, até então, demarcava claramente suas fronteiras, procurando colocar para dentro apenas alunos capazes de acompanhar seu currículo, deixando de fora os que não possuíam essa competência. Os alunos que, apesar de terem entrado, não conseguiam atingir os patamares desejados, eram simplesmente excluídos. Mesmo entre os alunos “regulares”, a heterogeneidade é clara, sempre existiu, ainda que fosse um tanto sufocada diante do princípio da homogeneidade, em que as diferenças individuais eram pouco ou nada atendidas. Numa tentativa de ajeitar as diferentes situações, eram comuns classes dividas em fortes e fracas. Esta prática hoje seria condenada. Agora, há o apelo e a ordem para que se inclua e se trabalhe com todos os alunos, na mesma classe, respeitando e cuidando das diferenças individuais.
A questão da inclusão escolar parece colocar uma lente de aumento naquilo que é tão próprio aos seres humanos: o fato de que nós todos somos singulares, únicos, marcados pelas nossas diferenças, e que a humanidade se faz por cada uma dessas singularidades. A diversidade é vista como algo positivo que deve contribuir para uma sociedade mais humana. Ao pensar a política educacional brasileira da inclusão escolar, Marcos Mazzotta e Sandra Souza1 nos remetem à importante filósofa Hannah Arendt2 e seu pensamento acerca da diversidade humana. Essa pensadora afirma que a pluralidade dos homens faz parte da condição humana, apontando para o fato de que estar e viver entre os homens significa assumir essa condição de pluralidade.
Segundo a filósofa, “na Terra, vivem os homens e as mulheres, e não o Homem e a Mulher. Todos são seres únicos, diferentes de qualquer outro que exista, tenha existido ou venha a existir; todos marcados por uma singularidade, que é a própria condição da pluralidade”. Para Mazzotta e Souza, “é o paradoxo da pluralidade de singulares”. Ainda segundo esses autores, essa “igualdade de desiguais precisa ser garantida socialmente através da possibilidade de participação ativa no convívio social”. Só assim estaremos mais próximos de conceitos como os de cidadania e inclusão social.
Como garantir uma participação ativa
No entanto, o que é um direito da criança traz um grande desafio para os professores: o desenvolvimento de novas competências para incluir. Como garantir uma participação ativa em uma brincadeira de parque de uma criança que está em uma cadeira de rodas? Como podem agir professores e as demais crianças para incluir esse aluno?
Além do conhecimento detalhado das necessidades especiais que envolvem cada portador de determinada síndrome, é também necessário estar atento para as características subjetivas que essas crianças trazem. Trocar com as famílias, com especialistas e até mesmo ouvir as demais crianças pode ajudar a integração. A inclusão é também uma questão de afinar a sensibilidade para sentir de que maneira considerar a necessidade especial de uma criança de forma que ela possa ser atendida sem sentir-se negativamente diferente.
Como esse tema é novo para os professores e para as instituições de educação, é importante ouvir quem tem diante de si o desafio de incluir, respeitando as características individuais e contribuindo para que todas as crianças avancem e desenvolvam-se plenamente. O relato a seguir (O direito à diferença na Educação Infantil, texto de Daniela Teperman) contribui para fazer avançar a reflexão.
(Ana Carolina Carvalho, psicóloga, psicanalista e educadora)
1“Inclusão Escolar e Educação Especial: Considerações sobre a Política Educacional Brasileira”, de Marcos Mazzotta e Sandra Souza. Revista Estilos da Clínica, edição no 9, 2º semestre/2000.
2Hannah Arendt (1906–1975), filósofa alemã.