Quem disse que as famílias não se interessam pela creche? Convide os pais para participar de algumas atividades e confira o que eles pensam sobre essa experiência
Trabalhamos na Creche Despertar, na zona Sul de São Paulo. Participamos de um processo de formação profissional, por dois anos, que nos levou a pensar sobre muitos aspectos do trabalho que realizamos com as crianças. Desde 2001, vínhamos refletindo sobre as relações que tínhamos com a comunidade.
Achávamos que as famílias não participavam da educação das crianças na creche.Os educadores estavam muito desanimados e entendiam que as famílias não reconheciam seus esforços, não valorizavam o trabalho pedagógico desenvolvido com tanto empenho. Por outro lado, as famílias não se sentiam incluídas. Dessa forma, todos reclamavam, uns dos outros.
Era necessário transformar essas relações, oferecer momentos de convívio mais agradáveis, estreitar os laços de confiança mútua e compartilhar os cuidados com a educação das crianças. Surgiu, assim, a idéia de uma oficina de artes, já que estávamos finalizando em nossa creche um interessante projeto que envolveu artes visuais e comemorávamos as conquistas das crianças.
Cada grupo procurou planejar sua atividade com os pais a partir do que havia sido mais significativo em relação ao trabalho realizado com sua turma. Cuidamos de todos os aspectos, como fazemos com as crianças: escolhemos cuidadosamente os materiais, os suportes, as imagens para consultar e organizamos os espaços das salas para funcionar como um grande ateliê.
No dia combinado, os educadores receberam os pais, que participaram de muitas atividades. Maria Aparecida e Jaqueline, educadoras do berçário, procuraram oferecer aos pais algumas das vivências tão características da rotina da criança pequena, com o intuito de que conhecessem de perto como é o dia dela na creche, o que se faz por lá, enfim como é o trabalho.
Como proposta para a oficina, optamos por “fazer massinha”, o material mais apreciado no berçário. Algumas mães não gostaram da consistência, reclamaram dizendo: “Não sei como vocês têm coragem de mexer nessa meleca!”. Mas, no final, ninguém ficou de fora. Enquanto modelavam com a massinha colorida, íamos conversando sobre a freqüência e a importância de um trabalho com essas melecas, como diziam, com crianças tão pequenas.
Hellen e Nice, professoras do maternal I, fizeram uma dinâmica inicial para descontrair a todos e aproximar o grupo. Em seguida, ofereceram argila e ajudaram os familiares a se organizar nas mesas para a oficina de modelagem. Algumas mães riam e, envergonhadas, diziam: “mas meu filho vai rir quando vir isso”.
Com a ajuda das educadoras, foram se descontraindo, aproveitando a oportunidade, esquecendo a vergonha e o medo e, simplesmente, brincando. Ao final, todos disseram ter gostado muito e confidenciaram: “Já havíamos esquecido de como é gostoso mexer com essas coisas, dá até para esquecer as coisas duras da vida”.
Sandra e Glausileide, educadoras do maternal II, ofereceram estopa, papelão, muitas cores de guache e outros tipos de papel, tudo organizado em uma grande mesa central. Depois de uma breve conversa, todos puderam escolher os materiais que gostariam de usar, dirigindo-se para a mesa que ocupariam para trabalhar.
Nos pequenos grupos, os pais conversavam, trocavam idéias, davam sugestões. Ficamos com a estopa pintada pelos pais para confeccionar um tapete para o canto de leitura da sala, como se fosse um presente deles para os filhos.
Ao final, conversamos sobre o trabalho e, quem quis, pôde perguntar algo ou dizer o que pensava. Muito satisfeitos, os pais disseram que nunca tinham usado guache e outros materiais.
A avó do Matheus fez uma avaliação muito interessante:
– Gosto do jeito como vocês trabalham. É o Construtivismo? Eu conheço esse método (sic). Ele respeita a criança. Eu também trabalho em creche, da igreja, e lá também é assim. É isto que temos que fazer: ouvir as crianças, trazê-las para dentro da creche, de uma maneira boa. (…) Vocês mostraram como trabalham bem com as crianças, eu gostei.
Laís, mãe do Arthur, quis saber mais.
– Quando o Arthur chega e me mostra um desenho, é errado eu falar que não está bom? Que eu não sei do que se trata? Porque, se eu falo isso, ele me responde que eu não entendo nada!
– Bem, Laís, você acabou de participar de uma experiência vivenciada muitas vezes pelo Arthur aqui na creche – lembrou a professora –, já pensou se eu dissesse que sua pintura ficou feia? Como você se sentiria?
– Eu não gostaria, mas aceitaria porque é uma opinião sua – respondeu ela.
– Mesmo sendo minha opinião, como ficaria sua auto-estima para continuar desenhando, pintando, pesquisando? Porque é isso que o Arthur e outras crianças fazem quando estão pintando. Eles pesquisam o mundo, expressam o que vêem e o que sentem. E, além do mais, o que é feio para uma pessoa pode não ser para a outra.
– E o que eu faço?
– Se interesse pelo que o Arthur quer te mostrar! Se for o caso de você não entender o que foi que ele desenhou, pergunte a ele!
Ela pareceu satisfeita com a sugestão e, pelo jeito, outros pais também. O resultado foi uma linda exposição, compartilhada na festa de confraternização com toda a comunidade. Ainda oferecemos um show musical e, como parte do coquetel, pães feitos pelos próprios pais que participam de um curso de padaria oferecido pela creche.
Na semana seguinte, quando as crianças chegaram à creche, ainda puderam ver mais um pouco da exposição organizada pelos educadores e pela coordenação.
Avaliamos nossa iniciativa como muito gratificante para os educadores, que se empenharam em pesquisar e planejar as atividades para os pais. O envolvimento de todos e a satisfação das crianças compensou o esforço.
Esperamos continuar investindo nessa aproximação com as famílias porque sabemos que cuidar e educar crianças são tarefas de todos nós, juntos, uns cuidando aqui, outros lá, reconhecendo e valorizando cada gesto e a palavra de cada um.
(Equipe da creche Despertar)
Creche Despertar. Tel.: (11) 5560 0536 Iniciativa: Instituto C&A