A entrada de uma criança pequena em uma instituição de educação não é preocupação apenas do seu educador, mas responsabilidade de todos os envolvidos. É importante que seja fruto de uma interação planejada entre os dirigentes, os educadores, os funcionários de apoio, a família, tendo em vista acolher a criança da melhor forma possível. Esta é a proposta da equipe do Centro de Educação Infantil Isabel Ribeiro1
A criança, ao ingressar na escola e separar-se dos pais, vive um momento delicado, em que precisa aprender a ficar longe do convívio familiar e a relacionar-se com diferentes pessoas em um novo ambiente. Por isso, é fundamental que o Centro de Educação Infantil (CEI) que a acolhe esteja preparado para lidar com este momento, planejando suas ações de forma a contribuir para que a criança não se sinta só e abandonada, facilitando assim sua adaptação.
O trabalho de acolher bem a criança e sua família deve implicar toda a equipe da instituição de educação: diretor, coordenador, professores, funcionários da administração, cozinha e limpeza. É um período especial, em que a rotina e o espaço da instituição são modificados. A reflexão sobre o acolhimento de crianças pequenas que ingressam na vida escolar pode ser feita a partir de diferentes aspectos que dizem respeito aos “personagens” envolvidos nesse momento: podemos enfocá-lo mais sob o ponto de vista da criança que chega, de sua família, do professor, da instituição e das crianças que já estavam nela.
Em outras edições da revista avisa lá, publicamos artigos referentes ao tema Acolhimento, sob o ponto de vista da criança (edição no 2, janeiro/2000) e das famílias (edição no 5, janeiro/2001). Neste artigo, enfocaremos o ponto de vista da instituição e do planejamento necessário para que se possa realizar um bom trabalho de acolhida.
Juliana Davini2, escrevendo sobre o acolhimento, aponta para a necessidade de toda a equipe de uma instituição de Educação Infantil estar envolvida no planejamento do projeto como um todo. “Acredito numa gestão da escola onde não só os professores são formados em serviço e acompanhados em seu fazer, mas também os funcionários da administração, cozinha e limpeza devem compartilhar desta formação, embora com objetivos e pautas diferentes. Outra forma não teremos para construir uma escola coerente, onde possamos falar em alguma sintonia, repartir preocupações, ter coleguismo, tolerância e apoio”.
Nas semanas em que a escola ou instituição de Educação Infantil recebe crianças novas, é preciso que todos os funcionários estejam sensibilizados e dispostos para as especificidades desse período, entendendo que a presença dos pais é necessária para um bom começo da escolarização de seus filhos. É preciso que os funcionários possam compartilhar do objetivo do trabalho do professor, dando o apoio de sua área, conhecendo os desafios e as etapas desse momento, afirma a autora.
Ainda segundo Juliana Davini, uma boa forma de conseguir essa participação de todos seria convidar a equipe inteira para uma reunião pedagógica cujo tema fosse o Acolhimento e que discutisse o planejamento da escola para a recepção das crianças novas, enfocando o trabalho e o apoio de cada área nessa empreitada.
Construindo juntos o processo de acolher bem
A cada ano, com a chegada de novas crianças e famílias, sentimos a necessidade de reorganizar a forma como realizamos o período de acolhimento. O objetivo é o de estabelecer vínculos e interação entre a família, a criança e os educadores, promovendo a superação das dificuldades enfrentadas nessa fase inicial do processo de entrada na Educação Infantil.
Planejando bem as ações, melhoramos a qualidade de nosso atendimento. Neste ano em particular, sentimos a necessidade de abranger toda a equipe de trabalho: educadores, equipe de apoio e coordenação, para o planejamento das atividades especialmente desenvolvidas para o recebimento das novas crianças e suas famílias. Dessa maneira, toda a equipe de trabalho teve oportunidade de emitir opiniões e reorganizar as atividades em sala, tendo como eixo o brincar, que se revelou como um conteúdo muito adequado ao processo de acolhimento e adaptação.
Para cada setor pensamos em procedimentos que viessem a contribuir com o bom acolhimento de todos os envolvidos. Organizamos e planejamos atividades tanto para as crianças novas como para aquelas que já freqüentavam o centro. A readequação do espaço físico e da rotina contribuiu significativamente para o melhor atendimento.
Planejamento do Projeto tendo em vista as diferentes funções
Educadoras
- Sensibilização para recepção das famílias e crianças recém-chegadas;
- Acesso às informações sobre hábitos e costumes das crianças transmitidos pelas mães para que elas possam se sentir mais tranqüilas e seguras no processo de acolhimento;
- Planejamento de atividades e cantinhos de exploração do brincar como forma de recepcionar melhor a criança, oferecendo opções diferenciadas de brincadeiras;
- Envolvimento nas brincadeiras e diálogos com as crianças para que ocorra a interação e as mesmas não se sintam sozinhas;
- Recepção atenciosa aos pais e crianças em sala.
Equipe de Apoio – Setor Saúde
- Sensibilizar para a recepção das famílias e crianças recém-chegadas;
- Acompanhar, na ausência da coordenação, os pais na visita às dependências do Centro de Educação Infantil, sanando as possíveis dúvidas que possam surgir;
- Recepcionar as famílias na entrada e saída informando sobre as ocorrências de forma a tranqüilizá-las quanto à presença de suas crianças na instituição;
- Observar hábitos alimentares das crianças;
- Observar higienização, acondicionamento, temperatura e preparo dos alimentos, orientando o setor responsável quando necessário.
Equipe de Apoio – Setor Cozinha
- Sensibilização para a recepção das famílias e crianças recém- chegadas;
- Elaboração do cardápio de forma flexível quanto ao preparo dos alimentos (temperatura, corte das carnes, alimentos mais líquidos, etc.) para as crianças do berçário maior, considerando que no início elas não têm a dentição completa, o que dificulta a mastigação de partes mais sólidas, e introdução de novos sabores com os quais ainda não tiveram contato no convívio familiar;
- Elaboração de cardápio semelhante aos hábitos familiares.
Diretora
- Entrevista detalhada com os pais ou responsável para obter informações necessárias a respeito das crianças;
- Apresentação das dependências do Centro de Educação Infantil no ato da matrícula;
- Sensibilização do Projeto de Acolhimento junto a toda equipe de trabalho;
- Elaboração de comprovante de matrícula com avisos gerais como: data de início dos trabalhos após consulta prévia e as atividades programadas;
- Reunião com os pais explicando sobre o funcionamento do processo de acolhimento das crianças novas e das que já freqüentavam o Centro de Educação Infantil.
Coordenadora Pedagógica
- Sensibilizar toda a equipe de trabalho sobre o Projeto de Acolhimento;
- Elaborar questionário para levantamento dos conhecimentos prévios das educadoras sobre o processo de acolhimento;
- Realizar leitura de textos sobre o tema para ampliação de conhecimento;
- Organizar o cronograma de entrada das crianças por grupos;
- Organizar um espaço específico para recepcionar os pais no período;
- Recepcionar e dar informações sobre as crianças após o acolhimento;
- Observar e orientar funcionários e pais ao perceber dificuldades no processo.
Reflexões sobre o processo
Vivenciamos algumas dificuldades na implantação do projeto de acolhimento devido ao quadro de funcionários incompleto nos primeiros dias de atividades. Essa situação exigiu um esforço maior de todos para cumprir o planejado e para que as famílias não se sentissem desamparadas e as crianças fossem bem acolhidas.
Esta dificuldade tornou-se uma prioridade, e assim mudamos a rotina da equipe de direção. Foram feitos revezamentos entre diretor e coordenador para atender os anseios e dificuldades das famílias e funcionários, bem como para que estivéssemos, um ou outro, presentes no momento de entrada e saída das crianças.
Observamos que a estratégia de apresentarmos as novas famílias aos funcionários no ato de matrícula, bem como a de mostrar todo o espaço físico com o detalhamento de algumas atividades realizadas, facilitaram o contato e a confiança para a troca de experiências. As informações das crianças dadas pelas família também vieram a contribuir para um melhor atendimento.
Acreditamos que a aproximação de todos os funcionários, equipe de apoio e educadoras com as famílias e a solicitação de que eles opinassem para a construção de um novo processo de acolhimento, contribuíram para que toda a equipe se sentisse valorizada e colaborasse espontaneamente no processo.
Ao permitirmos que as famílias, pai, mãe ou alguém a quem a criança estivesse acostumada pudessem ficar períodos maiores ou mais curtos no centro até que a criança ficasse bem, contribuímos para que as mesmas conhecessem uma parte do nosso trabalho e se tranqüilizassem sobre como seu filho ficaria após sua saída.
Ao percebermos ansiedade e insegurança nas mães das crianças do berçário maior, planejamos a estratégia da filmagem das crianças, em diferentes horários e atividades, ainda que elas estivessem chorando. Posteriormente, emprestamos aos pais a fita. As filmagens continham não mais que 20 minutos de gravação, mas permitiram que os pais pudessem assistir a seu filho dormindo, almoçando, chorando, brincando ou sorrindo.
Sensibilizamos as famílias para o conteúdo da fita, bem como para a necessidade de que fosse vista e devolvida em tempo hábil, para circular por todos os pais da sala. Foi um sucesso. As famílias assumiram o compromisso e devolveram a fita conforme o combinado, demonstrando estarem muito mais aliviadas quanto à presença de seu filho no CEI e às dúvidas decorrentes.
Consideramos que esta estratégia foi um marco no processo de acolhimento das crianças e suas famílias. Destacamos também que o envolvimento dos funcionários foi de fundamental importância para o sucesso do projeto. Como produto final, elaboramos um portfolio com relatos, avaliações das famílias e reflexões dos educadores e funcionários para que, por meio do registro, possamos continuar o aprimoramento do processo a cada ano.
1O Centro de Educação Infantil Isabel Ribeiro atende crianças de um a três anos e 11 meses, e é mantido pelo mosteiro São Geraldo, de São Paulo.
2Juliana Davini é coordenadora do Espaço Pedagógico, em São Paulo.
(Antonia Ferreira Santos e Maristela de Fátima Bueno, coordenadora pedagógica e diretora do Centro de Educação Infantil Isabel Ribeiro, respectivamente)
Ficha Técnica
Programa Capacitar Educadores – Iniciativa: Instituto C&A
Responsabilidade Técnica: Instituto Avisa Lá
Realização: CEI Isabel Ribeiro – Rua Eusébio da Costa Braga, 66 – Monte Kemel – São Paulo – SP. CEP: 05632-060 Tel.: (11) 3746-8321. E-mail: irmontekemel@terra.com.br
Equipe
Diretora: Maristela de Fátima Bueno
Coordenadora Pedagógica: Antonia Ferreira dos Santos
Educadoras: Josefa Elza Rodrigues da Silva e Luana Monteiro da Silva
Para Saber Mais
- Adaptação – Pais, Educadores e Crianças Enfrentando Mudanças, Madalena Freire e Juliana Davini. Série Cadernos de Reflexão. Espaço Pedagógico. Tel.: (11) 5506-5208 Site: www.pedagogico.com.br
- Revistas avisa lá, edição no 2, janeiro/2000 e edição no 5, janeiro/2001