Educação infantil e o cuidado seguro das crianças

Educação infantil: quem forma e supervisiona os professores e gestores para o cuidado seguro das crianças?

Damaris Gomes Maranhão*

As creches e pré-escolas têm divulgado suas propostas de trabalho com as crianças em diferentes canais das redes sociais e, muitas vezes, são apresentadas como boas práticas com respostas entusiasmadas, considerando que outras escolas poderão seguir aqueles exemplos.

Podemos levantar várias questões sobre o uso da imagem de crianças nas redes sociais, as diferentes formas de divulgação dos trabalhos, as práticas em si, mas nesse artigo queremos fazer um alerta para as várias situações de perigo em que as crianças são colocadas nas escolas e divulgadas nesses canais, transmitidas como práticas replicáveis.

Em 2011, antes da promulgação da Lei Lucas, foi publicado o artigo Conhecimento para proteger a vida, na Revista de Educação do Instituto Vera Cruz. Esse artigo aborda os principais riscos à saúde das crianças que frequentam creches, a partir de uma análise dos dados de mortalidade, noticiados na imprensa e da revisão de literatura científica sobre o tema. Descreve um programa de formação para professores de educação infantil que vem sendo desenvolvido em rede de creches, como uma das medidas que podem contribuir para a segurança das crianças. O professor adquire competências para ponderar os riscos reais frente aos imaginários, considerando seu conhecimento e compromisso com cada uma das crianças do grupo, no sentido de apoiá-la para explorar ambientes, brincadeiras e situações de aprendizagem com prazer e segurança[i].

Após quatorze anos da publicação do artigo citado continuam sendo veiculadas notícias sobre morte de crianças da educação infantil. Essas mortes poderiam ser evitadas com cuidados adequados a cada faixa etária e às demandas do processo de crescimento e desenvolvimento de cada criança, evitando materiais e atividades de grande risco em contexto coletivo.

O objetivo deste texto é reiterar aos gestores, professores, coordenadores pedagógicos e instituições responsáveis pela atualização dos profissionais que atuam na educação infantil, a importância dos procedimentos de cuidados promotores do crescimento e desenvolvimento saudável e na prevenção de doenças e acidentes.

A Lei Lucas exige a formação e atualização dos professores sobre Suporte Básico de Vida, pois é fundamental prevenir situações de riscos de engasgo, morte súbita no berço, quedas, afogamento, aspiração de substâncias tóxicas, entre outras.

Infelizmente continuamos observando, nas redes sociais, fotos sobre atividades em que os professores organizam propostas com “farinha de trigo”, por exemplo.
Em primeiro lugar, as crianças precisam brincar com farinha de trigo? Sim, ela tem uma textura diferente, mas há outros elementos no cotidiano da criança com texturas diferentes que ela pode ter acesso. Em segundo lugar, a farinha de trigo é um alimento e as crianças podem conhecer os alimentos na hora das refeições ou no preparo de uma receita.
Do ponto de vista da saúde, principalmente para os bebes e crianças bem pequenas, a farinha de trigo pode ser aspirada, causando por exemplo, uma doença semelhante a “asma do padeiro”, que pode irritar as vias aéreas, desencadear uma rinite ou até piorar alguma doença pulmonar já existente.

As bexigas ou balões de encher são de látex fino e também podem causar obstrução das vias respiratórias ou engasgo, caso as crianças coloquem pedaços de bexiga estourada na boca, levando à morte.

Bacias contendo água, mesmo em baixo nível, podem causar afogamento se a criança acidentalmente escorregar com a cabeça dentro da mesma.

A oferta de mamadeiras para bebês na posição deitada pode levar a drenagem de leite para o conduto auditivo, gerando infecções auditivas.

Os procedimentos inadequados de higiene e troca de fraldas, conforme histórico de observação de algumas práticas na rede privada ou pública, podem aumentar o risco de disseminação de infecções gastrointestinais.

Enfim, quedas, engasgos/sufocamento, afogamentos, queimaduras, intoxicações e acidentes com animais não são comuns e podem ser evitáveis.

Se educar e cuidar são indissociáveis, por que nas práticas pedagógicas, muitas vezes, esses cuidados estão ausentes?

Uma das perguntas que tem me instigado nos últimos tempos é: como os cursos de pedagogia formam professores para que desenvolvam atitudes e procedimentos adequados a cada criança no contexto de educação infantil. E além da formação básica, como estes temas são abordados na educação continuada dos gestores, professores, auxiliares?

(*) Damaris Gomes Maranhão –  enfermeira, dra. em Ciências da Saúde, consultora do Avisa Lá e colaboradora do MEC nos RCNEI, DCNEI e BNCCEI.

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[i] Gomes Maranhão, D. (2025). O conhecimento para preservar a vida: um tema delicado. Revista Veras1(2), 255–271 https://site.veracruz.edu.br/instituto/revistaveras/index.php/veras/article/view/14

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