Beber água na escola: um direito e uma necessidade de saúde

ELIANA CHALMERS SISLA E ELZA CORSI¹


BEBER ÁGUA QUANDO SE TEM SEDE É UM DIREITO E UM HÁBITO QUE SE CONSTRÓI JUNTO ÀS CRIANÇAS NA SATISFAÇÃO DA NECESSIDADE DE HIDRATAÇÃO²


Introdução

No café da manhã, o cardápio é um grande e grosso pedaço de bolo de chocolate e leite com achocolatado (presumo, que bem açucarado), servido em canequinhas plásticas… Observo uma criança que vai até o filtro, ela acabou de comer e parece estar com sede, mas não há copos.

Volto a ficar sozinha no refeitório, observo um garoto de cerca de 2 anos, penso ter ouvido ele dizer “água” em seu jargão. A educadora entra e o leva para a sala, sem que nada tenha bebido.

No refeitório, outro garoto reclama que está com sede, já desde o café o vejo rondar o filtro, não há filtros ou jarras na sala, a professora não percebe e continua a atividade. Constato: quem não se comunica não bebe água.


1 Eliana é psicóloga e Elza é nutricionista, ambas formadoras do Instituto Avisa Lá em Gestão para os Cuidados, Saúde e Bem-Estar.
2 Ver também: Pelo direito de beber água, Revista Avisalá no 35, julho de 2008.

Estes registros foram realizados em uma creche e alertaram-me sobre a questão da hidratação das crianças na Educação Infantil, sobretudo com relação às crianças menores que ainda não se comunicam bem. Mas também nas EMEIs observei inúmeras vezes que a hidratação das crianças não é preocupação nem motivo de planejamento. Bebedouros no pátio com um único copo para todos é ainda uma realidade comum em alguns recantos do País e, na sala, nenhuma opção de se servir de água conforme a sede.

Em uma escola pedi para que abrissem o enorme bebedouro de alumínio. Depois de a funcionária ter contornado a dificuldade com os inúmeros parafusos enferrujados, observamos atônitas o estado interior: ferrugem e formigas
tornavam a água, presumivelmente potável, em inadequada para consumo.

Lembrei-me de algumas viagens que fiz a locais muito pobres em nosso País. Havia na entrada das casas uma bilha com copos de alumínio para que o visitante se servisse. Bem areados, brilhavam ao sol, a água fresquinha era irresistível. Oferecer água a quem chega é, desde tempos imemoriais, sinal de hospitalidade.

As crianças com acesso à água nos diversos ambientes da escola têm a possibilidade de saciar a sede e assim autorregular o próprio organismo. Entretanto isso não é suficiente.

Por que construir o hábito de beber água?

Água é o nutriente (alimento) mais abundante e necessário à vida no planeta. A vida humana depende da ingestão diária de água. Ela participa de múltiplas funções no organismo e é responsável pela regulação térmica do nosso corpo, participa do transporte de inúmeros nutrientes, da eliminação de substâncias tóxicas (pela excreção), dos processos de digestão, respiração e circulação. Nenhum outro nutriente tem tantas funções no organismo como a água. Podemos também ingerir água por meio do consumo de diferentes alimentos. As frutas, por exemplo, têm até 95% ou mais de água, e a carne, cerca de 50%. Em compensação, o açúcar e os óleos não contêm água. Quanto maior o volume de água dos alimentos menor o valor calórico; quanto maior o consumo de produtos ricos em água, como frutas e legumes, menor também será a necessidade do consumo de água in natura.

Os bebês e as crianças pequenas possuem na composição de seu corpo aproximadamente 80% de água, isto porque o metabolismo dos pequenos é muito intenso, em decorrência do crescimento. A privação do consumo de água em bebês, como se sabe, leva à morte em poucos dias. A variação de cerca de 1% no grau de hidratação pode levar ao aparecimento dos sintomas da desidratação.


Sugestão para um projeto institucional tendo como meta melhorar a hidratação das crianças

Plano de ação: Água para beber – saúde e hospitalidade
Diagnóstico

Em nossa escola não nos preocupávamos com a hidratação das crianças. O bebedouro ficava no pátio porque achávamos que, nesse espaço, as crianças teriam mais necessidade por conta das atividades de brincar e correr. Observamos que muitas crianças saíam das salas para beber água. No recreio, a fila que se formava era enorme.

Junto ao bebedouro, as canecas de plástico eram dispostas de forma desorganizada, amontoa das em uma grande bacia, e observamos que várias delas se serviam de copos que haviam sido utilizados por outras crianças, significando risco de contaminação. A auxiliar recolhia-os após os recreios e os lavava em uma grande bacia, o que também não é apropriado, pois potencializa a proliferação de micro-organismos.

A manutenção da limpeza do bebedouro era muito difícil, isto porque o técnico não vinha à escola de forma sistemática e nós não sabíamos realizar a manutenção. Além disso, era um serviço pago e, por vezes, a verba não estava disponível.

A equipe desconhecia a necessidade de hidratação tanto das crianças quanto dos adultos. Muitas apresentavam problemas de rouquidão e ardência na garganta. Elas ficavam surpresas em saber que a água, além dos inúmeros benefícios para o organismo, também contribuía para hidratar a garganta e evitar problemas de ordem fonoaudiológica.

As professoras não sabiam que era preciso lembrar as crianças de beber água com frequência, tampouco que deveria haver uma rotina, de forma a construir o hábito de se hidratar e garantir as necessidades diárias de líquido.

Nunca havíamos conversado sobre isso com os pais; fazíamos como na maioria das escolas do Fundamental: um bebedouro no pátio e cada um que se virasse. Aprendemos que, na Educação Infantil, é diferente. As crianças estão descobrindo que beber água é um hábito que, se construído na primeira infância, ficará para toda a vida. Um hábito de saúde e de autocuidado.

Objetivo geral

Possibilitar às crianças a construção do hábito de beber água e o conhecimento sobre suas necessidades fisiológicas, aprendendo a se cuidar.


As escola e creches são responsáveis por garantir a integridade física e o bem-estar das crianças e, para tanto, precisam criar uma rotina de oferta de água que atenda a essa demanda e facilite a construção do hábito de beber água. Com as crianças bem pequenas que começam a falar, é preciso criar condições para que aprendam a nomear suas necessidades, tomem iniciativas e sejam estimuladas ativamente a consumir água.


Objetivos específicos

♦ Organizar um local com oferta de água fresca de forma permanente em cada sala de atividade.
♦ Comprar filtros de barro para suprir as necessidades em cada sala.
♦ Solicitar aos familiares copos individuais, que serão trazidos pelas crianças todos os dias.
♦ Substituir canecas de plástico da escola por canecas de vidro temperado.
♦ Velar pela higiene adequada dos copos de uso coletivo da escola.
♦ Organizar uma rotina sistemática de manutenção do bebedouro.
♦ Formar os professores para que conheçam a função da água no organismo, as necessidades de ingestão diária de adultos e crianças e para que eles construam o hábito de beber água.
♦ Formar os professores para que proponham às crianças a ingestão de água nos momentos estipulados na rotina, bem como nos momentos em que tiverem sede.
♦ Convidar a nutricionista para que informe às merendeiras e a toda a equipe sobre os alimentos que contêm mais água, mantendo um cardápio equilibrado em oferta de líquidos e alimentos que forneçam água.
♦ Orientar as auxiliares de limpeza para que mantenham uma rotina de fornecimento de água nas salas.
♦ Orientar as merendeiras sobre a manutenção dos filtros de barro e a importância de registrar no quadro os dias em que ela será realizada.
♦ Reunir os familiares para informar sobre as necessidades de hidratação de adultos e crianças e compartilhar projeto em questão. Estimular o envio dos copos nas mochilas e a manutenção de sua higiene todos os dias.
♦ Organizar um mural de saúde, manter atualizadas as informações do projeto com fotos das crianças e seus respectivos relatos. Incluir lembrete relativo às responsabilidades dos familiares e da escola: limpeza da caixa d’água, manutenção dos bebedouros e dos filtros, rotina de oferta de água. Incluir artigos interessantes sobre hidratação e imagens bonitas.
♦ Colocar no hall da escola uma mesa com bandeja forrada de renda, copos e uma jarra de água perfumada com casca de limão para os familiares e equipe.
♦ Incluir na lista de materiais o copo da criança, explicando no fôlder da escola as razões, as quais devem ser retomadas na reunião de pais novos.
♦ Incluir no manual de boas práticas da escola orientações para a hidratação das crianças e dos funcionários.
♦ Retomar este conteúdo no planejamento de cada ano.


Cabe aos gestores velar pela potabilidade da água oferecida aos pequenos. Caixas d’água precisam ser lavadas e desinfetadas semestralmente, e o registro da limpeza da caixa d’água deve ser afixado no mural de saúde da escola. Os gestores precisam pesquisar entre os diversos tipos de filtragem o mais adequado às condições da escola. Inúmeros sistemas de filtragem dependem de visitas sistemáticas de técnicos, que são cobradas. Por isso, a escola e o município precisam prever esse gasto em orçamento ou escolher outro tipo de filtro cuja limpeza possa ser realizada pelos funcionários do estabelecimento escolar.

O diretor da escola deve conversar com os professores e equipe operacional sobre a necessidade de hidratação com vistas ao bom funcionamento do organismo, e, principalmente, como planejar a organização na sala de atividades, no refeitório e no pátio, de modo que as crianças tenham acesso permanente à água fresca para saciar a sede.

É bom lembrar que as crianças são grandes observadoras e que tendem a reproduzir as atitudes dos adultos. Nesse sentido, construir o hábito de beber água com os adultos da escola será um bom desafio para os gestores.


Orientações quanto à individualização dos utensílios e higienização

É necessário individualizar os utensílios, copos, canecas ou garrafinhas. Estes, junto com a escova de dente, o pente, o sabonete e o xampu, toalhas, fazem parte dos materiais que as crianças trazem de casa todos os dias na mochila. Somente desta forma é possível minimizar a contaminação inerente aos espaços coletivos.

A família deve ser orientada com relação à higienização diária destes materiais. Mesmo que a família não o faça com a regularidade desejada, as colônias de fauna e flora presentes nos utensílios individuais são conhecidas pelo sistema imunológico da criança que criou algumas defesas contra micróbios domésticos.

Considerações para a escolha de utensílios para beber água:

Copo de vidro temperado

Vantagem: é o mais indicado, pois permite ótima higienização e não quebra com facilidade. Para as crianças menores pode-se prever as canequinhas com alça. Além disso, a escola deve se aproximar dos hábitos culturais de sua comunidade; em geral nos ambientes domésticos as crianças usam copos de vidro.
Desvantagens: é necessário um maior investimento inicial, mas, por sua durabilidade, acaba por compensar.
Higiene: Os copos de vidro devem ser lavados em água corrente, potável, ensaboados, enxaguados e deixados para escorrer e secar. Esses procedimentos, apesar de aparentementes simples, nem sempre são praticados no cotidiano das UEs, por hábitos regionais ou por uma questão de economia de água; outras formas de limpeza são utilizadas, como ensaboar todos os copos na mesma água, comprometendo, assim, o processo de higienização.

Copo descartável

Vantagem: Se bem acondicionado, elimina a contaminação por micro-organismo.
Desvantagens: Além de poluir o meio ambiente (200 anos para se decompor), é de difícil manuseio para as crianças menores de quatro anos.


Qual é quantidade diária de água que precisamos ingerir?

Um adulto pode passar até 28 dias sem comer, mas apenas três sem água. A quantidade necessária de consumo diário de água depende de muitas variáveis. A constituição física, a idade, o sexo, o clima, a realização de atividades físicas e os alimentos ingeridos, tudo isso contribui para a maior necessidade de ingestão de água ou não. Os alimentos são fontes importantes de água para o organismo, correspondendo em média 19% (cerca de 700 ml/dia) do líquido necessário, o restante deve ser proveniente de líquidos, principalmente água, mas também, sucos naturais sem açúcar.

No caso das crianças, a quantidade também varia de acordo com a idade e depende da atividade física, do clima, da qualidade do ar e das condições de saúde. Em caso de febre, diarreia ou infecções respiratórias, é importante aumentar o consumo de água. Os pequenos são mais suscetíveis à desidratação, eliminam água com mais rapidez; além disso, muitas vezes não têm consciência de suas necessidades. O leite e também as frutas são importantes fornecedoras de água para o organismo das crianças. Quando a água está disponível as crianças aprendem rapidamente a se autorregular.

Mas é preciso que a água seja ingerida de maneira espaçada ao longo do dia e distantes das refeições. A escola, por sua vez, precisa organizar uma rotina de oferta de água – ao receber as crianças logo cedo, antes e depois das atividades ao ar livre, depois do sono ou no meio da tarde –, além de oferecer frutas no lanche e legumes e saladas suculentas nas refeições, que complementam as necessidades diárias de líquido.


Filtros de barro – uma invenção brasileira

Pesquisas mostram que os filtros à vela, os filtros de barro, são muito eficazes na retenção de cloro, pesticidas, ferro, alumínio, chumbo (95% de retenção) e ainda retêm 99% de Criptosporidiose, um parasita causador de doenças. Em outras palavras, o sistema básico de filtragem de água, inventado pelos brasileiros, é um dos mais eficientes do mundo.

As vantagens do filtro de cerâmica são bem conhecidas: refresca a água de modo natural, sem gasto de energia elétrica; filtra e purifica a água com a eficácia da maioria dos purificadores (no caso dos filtros cuja vela possui carvão ativado revestido com prata coloidal); apresenta custo de manutenção baixíssimo, entre os produtos para consumo doméstico de água; têm uma durabilidade praticamente ilimitada, sendo necessária apenas a troca das velas, a cada seis meses, ou a cada três meses em ambientes coletivos.

A limpeza das paredes e das velas deve ser feita unicamente com esponja macia e água corrente de maneira a não remover o biofilme que contribui para a filtragem adequada da água.


Oferta de água no horário das refeições?

Esta é uma questão bastante frequente. Diversos fatores podem influenciar o consumo de líquidos nas refeições, o cardápio oferecido, o clima, a oferta de líquidos no intervalo das refeições, a atividade física realizada e o hábito cultural das famílias. O que se verifica é que com sede é quase impossível comer e, por vezes, é preciso ingerir algum tipo de líquido para continuar a refeição. Além disso, sucos de frutas cítricas, ricos em vitamina C, sem adição de açúcar, no almoço e/ou jantar, colaboram com a absorção do ferro, mineral fundamental para a construção da hemoglobina. Mas é bom ressaltar que as crianças podem trocar facilmente o líquido pela refeição. Por isso deve-se prever a oferta de líquidos, de sucos naturais ou de água, confiar na autorregulação das crianças e observar se não exageram na ingestão de líquidos em substituição aos alimentos.


Pense bem ao utilizar plástico

Sobre o Bisfenol A

O Bisfenol A (BPA) é um composto utilizado na fabricação de policarbonato, um tipo de resina usada na produção da maioria dos plásticos. Segundo os pesquisadores, o componente tem similaridade com o hormônio feminino e da tireoide. Segundo estudos, a substância aumenta os riscos de problemas endócrinos em crianças pequenas. Nos adultos, potencializa as chances de câncer de mama e problemas cardíacos.

Saiba como evitar a exposição ao BPA

♦ Para os plásticos, fique atento aos símbolos de reciclagem 3 (PVC) e 7 (PC) nas embalagens, pois podem conter BPA.               ♦ Sempre que possível, dê preferência a recipientes de vidro;
♦ Sempre use mamadeiras e utensílios de vidro ou BPA free para os bebês;
♦ Jamais esquente ou leve ao freezer bebidas e alimentos acondicionados no plástico.
♦ O BPA é liberado em maiores quantidades quando o plástico é aquecido ou resfriado.
♦ Descarte utensílios de plástico lascados ou arranhados. Não utilize detergentes fortes, esponjas de aço ou máquina de lavar louça para lavar recipientes de plásticos.
♦ Sempre que possível, opte pelo vidro, porcelana e aço inoxidável na hora de armazenar bebidas e alimentos;

Fonte: http://www.ecycle.com.br/component/content/article/35-atitude/613-voce-sabe-o-que-e-bpa-conheca-e-previna-se.html
Fonte: http://portal.anvisa.gov.br/wps/wcm/connect/anvisa+portal/anvisa/sala+de+imprensa/assunto+de+interesse/noticias/anvisa+proibe+bisfenol+a+em+mamadeiras
Posted in Revista Avisa lá #64.