O “Avisa Lá Indica” deste mês é composto por um vídeo e um texto (abaixo) da formadora Ana Carolina Carvalho sobre um lindo livro para crianças e adultos.
Obrigado, de André Neves, editora Pulo do Gato.
Neste livro, André Neves faz homenagens a alguns poetas que seguem dentro dele. Não à toa, nomeou o livro com a palavra Obrigado. Não poderia ter sido uma escolha mais feliz. A origem da palavra diz tudo. Obrigado é ob-ligado. É o que sentimos quando alguém nos faz um favor. Isso nos liga ao outro. Nos impele a fazer algo em troca. E é o que lindamente André Neves faz neste livro.
Na capa vermelha, vemos os pés de um menino – ou seria uma menina? – calçando pés de pato. Pronto para ir ao mais profundo, empreitada das profundezas, um mergulho que nos convida a ir junto. As águas vermelhas nos remetem ao sangue, não aquele que sugere violência, mas outro, que nos indica o que corre nas veias. Nas veias de André, está a poesia.
Passando a capa, as guardas azuis. O vermelho nos leva ao profundo, o azul pode nos levar a voos. Ao céu, ao sonho, a imaginação. No voo de André, está a poesia.
E nas guardas, se as abrimos, se vamos além nesse voo – e o leitor deve sempre ir além, ele é este investigador do livro – encontramos um diálogo que é uma joia – não por acaso está escondida (um segredo: nada é por acaso neste livro). Neste diálogo, André nos dá uma pista. Na poesia de André, está a criança.
Seguimos explorando o livro. Na folha de rosto, vejo duas pequenas gravuras, quase iluminuras. O tempo é retratado nessas singelas gravuras, na aquarela, no livro deixado no campo, no mato que cresceu em uma delas. No formato de selo – que coisa antiga, que coisa rara e de outros tempos. No passado de André, está a poesia.
E eis que um menino – ou seria uma menina? (talvez isso dependa do leitor, que bonita essa abertura do livro para quem o lê) surge naqueles selos do passado lendo o livro deixado ao léu. E então, entendemos do que se trata o livro. Um encontro do menino ou da menina com o livro encontrado no meio do mato feito de palavras. No livro de André, também está ele mesmo.
E a sua ligação (o tal ob-ligado) profunda com os poetas que habitam a sua casa de palavras e imagens. São 15 os poetas que ganharam os versos de André. Hilda, Mario, Manuel, Cecília, João, José, Ferreira, Vinicius, Cora, Patativa, Cruz e Sousa, Murilo, Paulo. São muitas as ligações que encontramos com a obra de cada um deles, nos versos, nos detalhes das ilustrações, nas frases escolhidas a dedo, ditas em entrevistas ou escritas em trechos de poemas. Um presente que nos liga, de modo muito profundo e delicado, ao André Neves leitor de poesia.
É uma obra para crianças? Pode ser. André escreve para crianças, porque as crianças estão sempre dentro daquilo que escreve. E não estão em todos nós? É uma obra para todos. Que não só nos apresenta grandes poetas brasileiros, mas nos oferece a leitura e as palavras de outro poeta. E os seus sonhos grudados nos olhos. (No finalzinho do mergulho, se procurar bem, encontra essa frase escondida no livro).
Indico para as crianças de todas as idades, aquelas que são, as que ainda e as que sempre serão.