Entrei para o mundo da leitura antes de ir à escola. Sou a filha mais nova, via meus irmãos e primos indo para a escola, aprendendo a ler, queria também. Então pedi que minha irmã, que já estava no ginásio, me ensinasse. Fizemos um trato: todos os dias, depois que ela terminasse de ajudar minha mãe com os serviços domésticos, ou seja, depois do almoço, ela me ensinaria. E assim teve início minha trajetória pela leitura. Ela começou ensinando-me as letras do alfabeto, a formar palavras, a fazer contas. Eu ficava radiante, principalmente porque nem estava na escola e já sabia ler e escrever.
No ano seguinte, eu ainda não iria para a escola, pois só tinha 6 anos e completaria 7 apenas em agosto. Não fiquei muito preocupada porque achava que minha irmã me ensinaria. Só que ela começou a estudar no período da tarde, e não podia mais me ajudar. Fiquei triste. Foi quando soube que minha vizinha montaria um grupo de crianças que já estavam na escola, para ajudálas, tirando suas dúvidas. Fui até lá e disse que queria participar. Ela me falou:
– Mas você ainda não está nem na escola!
Respondi:
– Mas já sei ler e escrever.
Com muita insistência, ela deixou. E como eu não estava na escola e não tinha lição de casa, ela sentava comigo naquele horário e lia para mim livros como Cinderela, Chapeuzinho Vermelho, etc. Ao chegar em
casa, contava todas as histórias para minha mãe. Quando entrei na escola, não entendia por que as outras crianças não gostavam de ler, e fiquei sem entender muito tempo.
Até que, em outubro de 1998, fiz a
capacitação de mediador de leitura, com o projeto Biblioteca Viva da Fundação Abrinq pelos direitos da criança. Então entendi por que as crianças e adolescentes não gostam de ler. É porque nunca tiveram a oportunidade de alguém que lesse algo para eles, com o simples objetivo do prazer pela leitura. Sempre, depois da leitura, havia uma cobrança que a tornava uma obrigação, algo chato. E se não lhe ensinam o prazer, você não consegue tê-lo.
Livro Ilustrado, Eugenio Zampighi (1859-1944). Agenda Unicef 1999.
Conclusão: pelo fato da Estela, minha vizinha, me ensinar o prazer de ler, mesmo que de forma inconsciente, nunca tive problemas em ler os livros que os professores pediam na escola, pois, sempre que lia, viajava no mundo imaginário das histórias. E por força do destino, essa vizinha se tornou professora. E o meu filho freqüentou sua escola desde o jardim até a pré-escola. Hoje ele está na segunda série e é um dos melhores alunos em leitura.
(Deise Cosme S. Caramigo, educadora do Centro de Juventude do Instituto Rogacionista.)
Obs.: Nunca tive uma professora que fizesse leitura de histórias para nós em sala de aula.
