Animais marinhos e suas medidas

O trabalho com grandezas deve ter relação com alguma exploração do ambiente para que as crianças aprendam o significado de uma prática social
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Desenhos feitos pelas crianças da Escola Miró, de Ribeirão Preto – SP

As medidas fazem parte do nosso cotidiano e, por isso, as crianças estão sempre em contato com elas. Desde bem pequenas, escutam quando os pais ou responsáveis pedem 200 gramas de carne no açougue, ou que às 10 horas vai começar o jogo na TV. Elas também já fazem suas relações na escola quando percebem um colega mais alto, um outro mais magro. Esses primeiros contatos com um vocabulário específico permitem afirmar que elas participam de algumas idéias transmitidas pelos adultos, aproximando-se de maneira contextualizada das palavras que implicam grandezas1.

Na pré-escola, o objetivo é incluir o tema oferecendo mais oportunidades para que as turmas possam dar sentido a algo prático, como a resolução de problemas na vida diária, quando o conteúdo resolve efetivamente uma questão. Inúmeras atividades foram propostas ao grupo formado pelos pequenos de 4 e 5 anos da Escola Miró, em Ribeirão Preto – SP, para aprofundar significados já conhecidos e construir novos. Os objetivos eram promover a familiarização com unidades de medida de comprimento, apresentar instrumentos que ajudam a medir comprimento e utilizar unidades de medidas convencionais ou não para resolver problemas de comparação de tamanhos.

Tamanho da bicharada
Durante o estudo sobre animais marinhos, as ações que envolviam medidas foram privilegiadas. Já sabíamos que um polvo gigante media 8 metros e que uma lula poderia ter até 17 metros. Levei, então, para a roda de conversa, várias publicações. Propus que procurássemos dados da mesma natureza sobre outros bichos para fazermos comparações. Dividi a sala em cinco grupos e eles iniciaram as explorações.

Professora – Como podemos encontrar essas informações? Alguém tem idéia?
Tiago – A gente procura os animais.
Duda – A gente procura os números.
Tiago – A gente mede com o lápis em cima.
Henrique – Mede com o dedo.

Deixei que investigassem. Dei um lápis ao Tiago. Quando os meninos encontravam uma imagem, usavam o utensílio para medir. Também utilizaram os dedos.

Professora – Será que os desenhos retratam a realidade?
Henrique – A baleia é bem maior.

Duda abriu um livro na parte do índice e disse que havia achado muitos números. Estava escrito:

Corpos de animais, 6
Cabeça de animais, 8
Borboletas e mariposas, 10…

Duda – Isso é o que tem no livro.Procuramos duas páginas indicadas para confirmar.

Falei um pouco sobre o que era um sumário, sua função. Enquanto isso, Isa, Tiago e Geórgiah identificaram um número em uma legenda e me pediram para ler.

Professora – Arraia encontrada por pescadores medindo 15 metros de comprimento.
Catharina – O que é comprimento?
Duda – É o tamanho.

Registramos a dimensão da arraia. João e Lipe se depararam com um tubarão-limão e também quiseram que eu lesse o texto ao lado da figura. Nele, continha mesmo informações sobre o animal e eles vibraram: “A gente achou!” Fizemos anotações e muitas relações. Como os pequenos ficaram empolgados com as primeiras descobertas, levei para nossos momentos de cantos revistas e enciclopédias para novas observações. Elaboramos um cartaz com recordes e curiosidades sobre o assunto e adiamos nossa conversa sobre instrumentos de medida para outra oportunidade.

Fotos: arquivo Escola Miró

Fotos: arquivo Escola Miró


Nossas medidas

Falamos sobre o tamanho dos pés e pedi que todos tirassem os calçados. Passei guache na sola e os carimbei em cartolinas. Depois, os pequenos fizeram comparações e agrupamentos: o dos pés compridos, o dos mais gordinhos, os maiores, os menores. Por fim, fizeram uma classificação decrescente e colaram-na em um cartaz, com o número de sapato correspondente de cada um. Fizemos o mesmo com as camisetas, verificando as etiquetas. Chegou, então, o momento aguardado.

Professora – Vamos descobrir nossos tamanhos?
Duda – Vamos ter de medir.
Professora – Como podemos fazer isso?
Antônio – Dá para medir com a régua.
Professora – O que mais podemos usar?
Isa – Tem uma fita de medir. Quando a costureira foi fazer a minha roupa para a apresentação do balé, ela usou.

Professora – Alguém sabe como chama?
Duda – Fita de medir.
Professora – O nome correto é fita métrica e quer dizer isso mesmo, Duda.

Levei para a roda uma fita métrica, um metro, uma trena e uma régua. Perguntei se eles conheciam aqueles instrumentos.

Tiago (mostrando a trena) – Isso dá para medir a casa.
Professora – Dá mesmo, Tiago. Depois podemos fazer o mesmo com a nossa sala. E esse (o metro), alguém conhece?
Catharina – Também é de medir.
Isa – Tem um monte de número também.
Professora – Vamos comparar todos? Vou colocar um ao lado do outro.
Antônio – Está igual! Olha: 10 aqui, 10 aqui…

Nesse momento, eles constataram que poderiam medir com qualquer um daqueles objetos, e que cada um é utilizado em situações específicas, ou seja, a fita métrica, em corte e costura; a trena e o metro, na construção civil; a régua, no desenho.
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Professora – Alguém sabe como a gente chama essa medida? É 10…
Duda – Mede 10, mede 20…
Professora – Centímetro. Daqui até aqui tem 10 centímetros. Isso quer dizer 1 centímetro, 2 centímetros, 3 centímetros… 10, 20 e assim por diante.

Vamos contar quantas marquinhas tem cada centímetro?

Todos – 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10…
Professora – Cada um desses risquinhos corresponde a 1 milímetro. Então, 1 centímetro tem 10 milímetros.
Professora (com o metro na mão) – Esse instrumento se chama metro. Vocês já ouviram falar?
Catharina – É o tamanho.
Professora – Lembram quando a gente leu que um polvo gigante tinha 8 metros de comprimento?

Vocês disseram que isso queria dizer o tamanho dele. Vamos contar quantos centímetros tem 1 metro? Contamos até 100 e as crianças constataram que a resposta era 100 centímetros. Continuei o estudo no dia seguinte, quando as medi individualmente e transferi suas dimensões para tiras de papel cartão. Elas as separaram em ordem decrescente e colaram-nas em um papelão.

Professora – João Pedro, você mede 100 centímetros, que a gente chama de 1 metro, e mais 20. Então, você tem 1 metro e 20 centímetros.

Repeti o procedimento com todos. Com o cartaz pronto, confrontamos os dados para saber quem era maior, menor e assim por diante. A intenção era fazer com que a turma atribuísse sentido ao utilizar unidades de medida em função de uma situação real, analisando a pertinência de usar um padrão externo quando a situação permite.

Medição com barbante

Preparei uma atividade para que o grupo pudesse reproduzir alguns bichos pesquisados nos livros. Levei para a sala um rolo de barbante e o metro, e perguntei como deveríamos fazer. Várias crianças disseram que não seria possível avaliar porque eles eram bem maiores que os instrumentos disponíveis. Outros sugeriram a trena, só que ela media 3 metros e, para elas, era igualmente impossível prosseguir na empreitada. Depois de muita conversa, expliquei que poderíamos fazer de metro em metro. Elas se convenceram.
Questionei quantas de nossa turma seriam necessárias para reproduzir o polvo. Estiquei o cordão e elas perceberam que só ficando em pé ao lado da linha não era possível, pois, dessa maneira, o tamanho dos pés é que seria computado. Então, se deitaram e concluíram que era preciso de mais ou menos sete. A surpresa e o espanto foram ainda maiores ao constatarmos que necessitaríamos de muito mais para fazer a lula gigante.
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Depois dessa experiência, cortei no barbante o tamanho correspondente de cada um e entreguei aos pequenos. Retomei as dimensões individuais na tabela confeccionada anteriormente e pedi que procurassem pela escola objetos de tamanhos similares. A meta era que achassem, pelo menos, dois itens. Bancos, corrimãos, trepa- -trepa, traves, pneus, linhas desenhadas no chão da quadra, escorregadores, cercas, pisos, troncos de árvores, folhas de bananeiras e até mesmo os jabutis não escaparam das aferições. Fizeram isso individualmente e em duplas. Muitas risadas, comparações e descobertas.

Terminada a busca, voltamos à sala e cada um falou sobre sua experiência. Solicitei que registrassem tudo com desenhos. O resultado da aprendizagem da meninada pôde ser visto durante as brincadeiras de faz-de-conta. Enquanto as meninas tiravam medidas de cintura, costas e punho das amigas para confeccionar roupas, os meninos mediam paredes, rodapés, bancos, mesas, desenhando e registrando tudo.

Vamos pesar?
Para ampliar os conhecimentos adquiridos até aquele momento, resolvi trabalhar com outras grandezas, como as medidas de massa. Providenciei uma balança e levei-a para a sala. Na roda, perguntei se os pequenos sabiam o que era aquele objeto e sobre sua serventia.

Catharina – É uma balança e serve para pesar. A gente tem de ficar em pé em cima dela, sem sapato e pisar com os dois pés. Quando a gente faz isso, sai o resultado aqui.

Ana Elisa – Precisa ser sem sapato porque senão o peso fica mais grosso.
Professora – Fica o que mesmo?
Alice – Fica mais alto.
Catharina – Fica mais grande.
Professora – Vocês querem dizer que fica maior? É isso?
Isa – É, mais para lá, para o outro lado.
Duda – É, maior. Em vez de marcar o número que você pesa de verdade, fica no que você não pesa.
Professora – Vamos agora pesar cada um de vocês nessa balança? Que tal a gente fazer isso com e sem sapato para ver o que acontece?

Ana Elisa foi a primeira. Ao subir, ficaram registrados primeiro 22,8 quilos com sapato e, depois, 22,4 quilos descalça. Eles ficaram admirados com a diferença. Fizemos isso com todos. Alguns calçados eram tão leves que sequer havia diferença. Registramos os numerais e, em seguida, perguntei:

Professora – Ana Elisa pesa 22,4 o quê?
João – 22 peso.
Professora – Quando lemos a medida de vocês no cartaz, dizemos: Geórgiah mede 1 metro e 13 centímetros. Quando pesamos alguma coisa, como podemos falar? Quando vocês vão ao supermercado e pedem para o balconista pesar alguma coisa, como fazem?
Duda – Quando meu pai vai ao supermercado, ele pede: Me dá 2 quilos de salame. Professora – Então, como é que falamos?
Clara – A gente fala quilo.
Professora – O que mais compramos por quilo?
Crianças – Arroz, queijo, tomate, feijão, batata, carne…

avisala_35_tempo30Por conta disso, levei para a roda um pacote de 5 quilos de arroz, um com 2 quilos de açúcar e um com 1 quilo de sal. Perguntei quanto eles achavam que pesava cada um daqueles produtos. Disse-lhes que na embalagem havia essa informação. Logo a criançada foi encontrando as marcas e fazendo suas leituras.

Duda – O arroz pesa 5 quilos.
Vinícius (sobre o açúcar) – Isso pesa 2 quilos.
Henrique (sobre o sal) – Esse tem 1 quilo.

Perguntei quantos quilos teríamos se juntássemos o arroz e o sal. Depois, o arroz e o açúcar. Por fim, o açúcar e o sal. Perguntei também quantos sacos de 1 quilo precisaríamos para 5 quilos. Eles foram calculando e respondendo. Chegou a hora de verificar os resultados e, ao colocarmos cada um deles na balança, ficamos surpresos, pois ela não era apropriada para pequenas quantidades. Sugeri pôr dois itens – o arroz e o sal – e nada aconteceu. Colocamos os três de uma só vez e aí, sim, ela marcou 8 quilos. A felicidade foi geral.

(Adriana M. Pinto de Oliveira, professora da Escola Miró, em Ribeirão Preto – SP)

1Trecho inspirado no currículo de Educação Infantil da cidade de Buenos Aires – Argentina.
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Ficha técnica

Escola Miró S/C Ltda. – Endereço: Rua Dr. Mário de Assis Moura, 380 – Jd. Nova Aliança – Ribeirão Preto – SP. CEP: 14026-578 – Tel.: (16) 3623-6255 / 3620-0552
E-mail: info@escolamiro.com.br
Coordenadora: Maria Cecília Nobrega de Almeida Augusto
Professoras: Adriana M. Pinto de Oliveira
Estagiária: Juliana Gaia

Para saber mais

  • As cem linguagens da criança, Carolyn Edwards, Lella Gandini e George Forman. Ed. Artmed. Tel.: 0800-703-3444

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